FIFA. O órgão máximo responsável pela tutela do futebol mundial. Com 209 países associados e 6 confederações continentais, esta entidade determina os destinos de várias modalidades como o futsal, futebol de praia e o amplamente conhecido futebol, desporto mais praticado no planeta.
Tendo sido fundada em 1904, organizou até hoje 22 Campeonatos Mundiais de futebol, expoente máximo da competição entre selecções. Esta competição é seguida por milhões de pessoas em todo o mundo, movimentando quantias astronómicas de dinheiro. Sendo os últimos 15 anos os mais rentáveis de sempre, estes campeonatos apresentaram um lucro consolidado de 12.91 mil milhões de euros (12.910.000.000€).
No entanto, no nosso ‘pequeno’ mundo da Fórmula 1 isso são peanuts… Nos últimos 15 anos, a nossa querida modalidade gerou 14.43 mil milhões de euros (14.430.000.000€). Tendo em consideração que no ano de 1999 o lucro era de 302 milhões de euros, a percentagem de crescimento situa-se nos 46%. Poucas outras modalidades poderão apresentar números idênticos. Em relação à FIFA, deixa-nos com um superavit de 1.52 mil milhões para, por exemplo, pagar o orçamento anual das 32 melhores equipas da Europa. E ainda sobrarem uns trocos para comprar o Cristiano Ronaldo.
Chega a ser caricato como uma modalidade que não tem nem 10% do total de seguidores do futebol, consegue criar uma máquina tão bem oleada e com resultados tão positivos. No entanto, este prisma é contrabalançado com uma distribuição de lucros pouco equitativa, levando o comum do adepto a interrogar-se para onde vai o dinheiro. Pois não é suposto equipas como a Caterham e a HRT falirem caso a receita fosse dividida correctamente.
De onde vem o dinheiro?
De grosso modo:
O grande cavalo de batalha de Ecclestone tem dado frutos nos últimos anos, uma vez que a organização e transmissão de eventos correspondem a cerca de 75% do lucro global. Quando viu a falta de apoios em volta dos eventos europeus (como Monza), virou-se para mercados asiáticos emergentes como Malasia, Singapura e Abu Dhabi. A organização destes GPs custa em média 66 milhões de euros, nove vezes mais que Monza (7 milhões). Países com pouca tradição nesta modalidade vêem o seu nome catapultado para o mercado mundial, permitindo-lhes aumentar e muito a quota turística. Consequentemente, temos o aumento de telespectadores no pais anfitrião, juntando aos outros milhões que seguem a F1 em circuitos fechados de televisão. Há muito que a modalidade deixou de ser serviço público, levando as cadeias televisivas a pagarem exorbitâncias pelas transmissões. Não existem números oficiais mas o acordo conjunto entre a Sky Sports e a BBC num período de sete anos (2012-2018), ascendia a 524 milhões de euros (75M€/ano e 3.75M€/corrida).
Numa altura em que os direitos de transmissão estão em alta, o número de seguidores está em baixa. De 2011 a 2014 a F1 perdeu cerca de 25 milhões de telespectadores, como consequência das transmissões se realizaram em circuitos fechados de televisão. As previsões estimam uma quebra de 5-6% por ano, tendo cifrado o valor de 425 milhões de telespectadores em todo o mundo, no ano de 2014.
Para onde vai o dinheiro?
Aqui está a parte ‘manhosa’ da questão. O Formula One Group – grupo que gere os direitos comerciais da F1 – é composto por várias empresas. Em última instância, o grupo é gerido pela empresa americana Delta Topco, detida essencialmente pela CVC Capital Partners (35%), Waddel & Reed (20.9%) e LBI Group (12.3%), sendo a restante fatia dividida pela família de Bernie Ecclestone (8.5%) e pelo próprio (5.3%). A parte marginal corresponde a outros investidores.
Ecclestone retirou uma fatia lucrativa deste império, tendo a sua fortuna avaliada em 3.56 mil milhões de euros. O jornal inglês Express noticiou que desde que assumiu o leme em 1974, Bernie negociou contratos que ascendem a 20.84 mil milhões de euros. Talvez um dos mais significativos seja o estabelecido com a cadeia alemã RTL em 1991, que gerou até à data 1.25 mil milhões de euros, abrindo a porta ao mercado de pay-per-view que temos actualmente.

Em média, 47.5% dos lucros anuais do grupo são direccionados às equipas. É o chamado prize fund. A distribuição é feita de forma mais ou menos equitativa, de acordo com a performance do ano anterior. Claro que isto gera o efeito bola de neve, com os grandes construtores como a Mercedes e Ferrari a encaixarem as maiores fatias. No entanto, se o lucro crescer “X”% ao ano, a distribuição não é feita de acordo com um factor multiplicativo de “X”. Se tal acontecesse, as equipas pequenas iriam sempre ter fatias maiores todos os anos.
O problema é que quando o valor aumenta, dois terços mantêm-se nos crónicos de sempre. E assumindo que o calendário está cada vez mais globalizado, os custos logísticos que as equipas pequenas têm de manter são incomensuráveis. Logo, lucros menores que não cobrem devidamente as despesas vão implicar restrições orçamentais… Restrições essas que impactam a competitividade, não sendo os monolugares desenvolvidos em condições. E todos sabemos que equipas que não ganham ou não pontuam são rapidamente esquecidas pelos patrocinadores. Efeito bola de neve, mas negativo. Esta situação facilmente se resolveria caso fosse proposta uma tabela criteriosa e transparente que permitisse às equipas perceber a fórmula usada na divisão do prize fund. Até lá, todos os anos vamos ter as zangas do costume, com cada um a puxar a brasa à sua sardinha.

E para além do ‘oficial’, temos o ‘oficioso’, com rumores dos supostos 5% de lucro que a Ferrari recebe a mais, pela sua herança e prestigio. É o mundo que temos… É a única equipa que participou em todos os campeonatos já realizados e da perspetiva do Grupo, transmite segurança a todos aqueles que investem na modalidade. A meu ver os princípios estão lá, mas a aplicação não é a correta. Assumindo que metade das equipas do plantel está em dificuldades financeiras, o prestígio não serve de muito se o pacote total a ser vendido não for atractivo. Uma equipa é tao boa quanto forem os seus adversários… Se disputássemos um campeonato do Mundo apenas com RedBull, Ferrari e Mercedes, posso garantir que haveria uma grande quebra nas receitas, pois o espectáculo na sua forma mais pura seria condicionado. Assumindo que os mercados asiáticos irão estagnar os lucros dentro de menos de uma década, as cabeças pensantes da Formula 1 terão de salvar o desporto em si e não só uma equipa.
Marcos Gonçalves
Um pensamento sobre “F1: Money, Money, Money”