Entrevista a Manuel Pedro Fernandes (Parte I)

12190115_10208191131285547_2356873280542133203_nDepois da vitória no Troféu Abarth, tivemos o privilégio de falar com o piloto Manuel Pedro Fernandes. Falamos do passado, do presente e do futuro. Uma conversa de quase duas horas que tentamos agora reproduzir aqui.

A história de Manuel Pedro Fernandes começa com uma das personagens mais queridas do desporto motorizado nacional… O grande Manuel Fernandes, piloto vilarealense, ídolo de muitos, que espalhou classe pelas pistas do nosso país nos anos 80 e 90. Manuel Pedro Fernandes aprendeu com seu pai a ser piloto mas acima de tudo a ser um homem de família.

Como piloto, Manuel Pedro Fernandes iniciou-se na Formula Ford em 1992, onde competiu até 98, passando para os turismo e sagrando-se campeão em 2000. Foi vice-campeão em 2002 na categoria 2 e em 2003 na categoria open. Venceu em 2014 a prova de Vila Real no Abarth e em 2015 sagrou-se campeão nacional do mesmo troféu.

2015 marcou o regresso às pistas do piloto e não quisemos perder a oportunidade de falar pessoal com Manuel Pedro Fernandes.

 

 

Esta pergunta já tem uma resposta conhecida de todos, mas interessa sempre saber um pouco mais. Como começou a sua aventura no desporto motorizado?

11082595_859127357481631_2116575471062616575_nA resposta é fácil claro, pois foi por causa do meu pai. Desde miúdo que via as corridas dele e que o acompanhava para todo o lado como tal, sempre estive em contacto e sempre tive esta paixão pelas corridas. Quando foi introduzido o campeonato de fórmula Ford houve a possibilidade de com 16 anos tirar uma licença especial para participar nas provas. Como o meu pai não gostava muito de Karts (e eu também não) apostamos neste campeonato. Compramos um carro e fomos para o Estoril para testar e começou. O meu pai foi de facto o grande impulsionador da minha carreira.

 

Era algo que realmente gostava ou foi mais o cumprir de uma tradição de família?

Não, era algo que realmente gostava. Desde miúdo que gostava de ver os carros e andar lá dentro. Não foi por obrigação, mas sim por paixão.

 

Como era na altura ser filho do grande Manuel Fernandes?

1508574_683751911685844_432081400602632060_nPara mim era muito bom. Toda a gente me conhecia e falava comigo e várias portas se abriram mais facilmente por causa do meu pai. Mesmo ao nível de patrocinadores era mais fácil com o nome dele associado e como tal, para mim foi muito bom.

 

Não sentiu a pressão extra no início por ser filho de um grande piloto e pelas elevadas expectativas que isso implica?

Nunca senti isso até porque fui na altura o estreante com o melhor tempo como tal, isso não se reflectiu. A pressão veio depois com os problemas que surgiram mas no início não senti qualquer pressão.

 

Foi importante ter ao seu lado um piloto experiente e com a qualidade do seu pai?

Sim, foi muito importante. Nos primeiros testes na Formula Ford o meu pai deu-me muitos conselhos e muitos truques que foram fundamentais no início. No final do primeiro dia ele incentivou-me a fazer ainda melhor, desafiando-me a travar ainda mais tarde. Além disso, ajudou-me muito a entender como afinar o carro e a entender as sensações que tinha ao volante. O meu pai acompanhou esse processo todo e ajudou-me muito em todos os aspectos.

 

Mas por muito bom que o professor seja, se o aluno não tiver talento de nada servem tantos conselhos.

10409094_859127917481575_265328682152847668_nAntigamente talvez contasse mais o talento, mas hoje em dia o que interessa é o dinheiro. Quem tiver mais condições, quem investir mais e tiver o melhor material, fica obviamente com uma vantagem significativa. O talento dilui-se muito com o dinheiro que se gasta. Eu via nos tempos da Formula Ford em que eu tinha um carro bom, mas quando vinham os pilotos de Inglaterra era tudo diferente. Material muito melhor e as condições também muito melhores e não há talento que se consiga sobrepor a isso. Outro exemplo que tive foi este ano quando testei para o WTCC. Enquanto eu testei com pneus velhos, o Hugo Valente fazia 3 voltas entrava nas boxes trocava de pneus e voltava para pista. Eu apenas tive um set de pneus novos no final do primeiro dia e infelizmente tive um problema na direcção e só fiz um terço da pista em boas condições. Quando cheguei as boxes pensei que era só compor a direcção e o problema estava resolvido, mas afinal os pneus também já estavam demasiado desgastados. E toda a logística conta muito. Eu dava 3 voltas e analisava os dados com o engenheiro. Tudo isto junto dá uma vantagem competitiva brutal em comparação a outros pilotos que não têm os mesmos recursos. Como vê, ter muito talento não chega. O mais importante é ter as condições ideais.

 

O talento do Manuel Pedro é inegável no entanto depois do PTCC deixou de competir. Porquê largar a competição?

11021228_840875362640164_2121747613811085633_nNa altura da Formula Ford no 2º ano, apostamos forte para vencer o campeonato. Compramos um chassis que levava um motor 1800, mas como estava a competir para os 1600 resolvemos colocar o motor e pesos na parte traseira do carro de forma a compensar o peso. Mas o carro era muito difícil de conduzir e não encontrávamos solução para a situação. Até que na última prova no Estoril, resolvemos tirar os pesos do carro e compramos uns alteres que levei comigo no cockpit e assim que fui para a pista, tirei logo 2 seg ao meu tempo. Nesse ano fiquei em 2º, mas podia ter conquistado algo mais. Mas faltava-nos um engenheiro de pista e faltavam-nos alguns pormenores que fazem a diferença. No último ano que participei tive um grande acidente onde desfiz o carro todo e nem fiz as últimas 3 provas desse ano. Foi aí que decidimos comprar o 320D. Entretanto fui campeão em 2000. Mas tínhamos sempre dificuldades em arranjar o financiamento necessário e depois exigia muito tempo e esforço da nossa parte. E com isso o gosto foi-se desvanecendo. Era tanto esforço e tanta preocupação que já não conseguia aproveitar as corridas. Não tinha o mesmo gosto assim. Foi-se instalando alguma desmotivação e com a morte do meu pai em 2005 ainda mais.

 

A morte do seu pai foi um facto importante para a sua retirada?

10268665_688878784506490_2369837857853447965_nSem dúvida. Embora ele já não fosse comigo para as corridas, ele vivia muito mais o automobilismo do que eu. Ele vivia para as corridas e transmitia-me essa paixão. Quando ele morreu deixei de ter isso. Quando o PTCC voltou a Vila Real resolvi correr cá. Tinha o carro e o sonho de correr em Vila Real por isso fui e consegui o 3º lugar, com alguma sorte admito, mas foi uma sensação muito boa e um dos melhores dias da minha vida. Foi pouco tempo depois da morte do meu pai e ir ao pódio e sentir o apoio do público foi muito emocionante.

 

Tema noção que é uma das bandeiras da cidade de Vila Real?

Eu gosto de pensar que sim, mas não quero nunca perder a humildade de reconhecer que é um fardo pesado. Tento sempre dar uma boa imagem da cidade. Faço questão de salientar para onde quer que vá, seja em competição seja em trabalho, que Vila Real é a terra do meu coração e é por Vila Real que corro e que faço isto. Sinto muito o apoio das pessoas, principalmente quando se aproximam as corridas. É muito bom sentir o calor e o apoio das pessoas.

 

Como foi estar tão perto de correr no WTCC em sua casa e de repente esse sonho foi-lhe negado?

11541908_908027982591568_2034883587346753147_nFoi um sonho que tivemos e fomos alimentando ao longo do tempo. Falamos com a Campos Racing e eles só nos deram uma resposta positiva apenas no início de Março. Então começamos a angariar patrocinadores e assim que tivemos a certeza que tínhamos o dinheiro necessário para fazer a prova contactamos a FPAK. Pediram-me o palmarés e pensei que estava tudo encaminhado para que corresse bem. Mas mesmo à última da hora disseram-me que não tinha o número suficiente de provas, que eram 10 e eu tinha 6. Como ganhei as 6 provas pedi que abrissem uma excepção. O presidente da federação disse que ia interceder por mim e até me disse que não iria haver problema. Como me pareceu que estava tudo encaminhado, continuei a tratar de tudo, até que recebemos o email a dizer que não seria possível eu participar na prova. Entretanto o presidente da federação tentou ajudar e ligou-me a dizer que poderia participar, desde que fizesse os testes com a Campos Racing em Paul Ricard. E mediante os testes e se até ao 2º treino livre o meu comportamento fosse bom, passavam-me a licença. Depois dos testes e do investimento feito para que isso acontecesse, fiquei a saber que afinal não haveria hipóteses de eu participar.

Obviamente que fiquei chateado pois disseram-me que seria possível e depois não foi. Para além do investimento feito para ir aos testes em França, tinha também os compromissos com os patrocinadores e a expectativa criada. Não queria ter dito que ia participar e depois dar o passo atrás.

 

Acha que houve má intenção no processo?

Não, longe disso. Penso que não houve má intenção e nós deveríamos ter acautelado a situação das 10 provas. Mas não acredito que tenha havido má-fé por parte do presidente da federação, que até deveria ter ficado contente por ter um piloto local a participar na prova.

 

E como correram os treinos do WTCC? Achou que conseguiria ser competitivo?

11692507_908028535924846_8453670577889932475_nPaul Ricard é uma pista complicada e ainda para mais não fiz muitas voltas. Como disse dava 3 voltas e tinha de voltar para analisar tudo. Achei que o carro andasse mais, sinceramente, pois ao nível da potência e da velocidade não me surpreendeu, mas nas travagens e nas curvas é realmente excelente. Era um carro que ia requerer trabalho da minha parte, pois não é fácil de conduzir. Nos testes perdia à volta de 1 segundo e meio para o Hugo Valente, que é muito mais experiente que eu e usava sempre pneus novos. Como tal, para um piloto que estava a conhecer ainda a pista e o carro, foi um primeiro contacto bastante positivo. É muito complicado nas travagens, pois é preciso aplicar muita força no pedal do travão, para além de termos de confiar muito no apoio aerodinâmico do carro. Mas penso que conseguiria ficar perto do top 10. Mesmo tendo de me adaptar e sendo um carro muito exigente a nível físico, acho que conseguiria uma boa prestação.

Para ter uma ideia, o Demoustier veio testar 4 dias antes da prova. Isso é que eu gostava de ter feito. Assim só pude dar meia dúzia de voltas cronometradas, mas foi uma experiência excelente e aprendi muito. Nunca tinha trabalhado assim com o apoio constante dos engenheiros e é excelente.

 

Ficou interessado em participar no campeonato?

Sim fiquei, mas depois quando se vê que é preciso um milhão de euros para fazer uma época inteira, o interesse desvanece. É muito dinheiro e aqui no interior é muito complicado arranjar apoios para chegar a esse valor. Se calhar se tivesse noutro sítio talvez fosse mais fácil, mas assim é complicado.

 

Está interessado nos TCR? É que faz falta, o Manuel Fernandes no CNV.

11235802_913528285374871_1860604798468412989_nEstou a estudar a possibilidade de participar nos TCR. Estou a pensar seriamente nisso. Eu também gostaria de participar no CNV, mas exige que eu mude a minha vida e preciso de ter a motivação para isso. E quando participo não gosto de perder e como tal, se entrar é para tentar ganhar e tenho de ter as condições para isso. Só assim faz sentido para mim participar no CNV. Eu estava um pouco de pé atrás para fazer os Abarth, mas comecei a vencer provas e comecei a motivar-me cada vez mais e se calhar a chama que estava escondida voltou. E agora consigo ter mais calma para errar cada vez menos. Sinto que agora controlo melhor isso. Tudo isto veio-me dar motivação para pensar seriamente em voltar a competir em 2016.

 

Mas é uma possibilidade ainda ou já há contactos feitos?

Já há contactos feitos para correr num SEAT Leon TCR pela Speedy Motorsport. Há ainda muita coisa para definir, mas estão a ser dados os passos para isso. Vai exigir investimento da minha parte e tem forçosamente de me dar gozo. Fiquei também interessado no campeonato europeu de abarth 695. Achei muito engraçado e conheci lugares novos, além de não exigir muito ao nível da preparação do carro, que é igual para todos e é muito mais engraçado ao nível das lutas. Gostei muito de conhecer as pistas novas e correr em Spa foi espectacular. Foi um sonho tornado realidade. Fazer Eau Rouge num Abarth é impressionante. Gostei muito e com isso fiquei muito interessado. Além de que os prémios são muito interessantes. Vou ter de optar por uma competição. Neste momento está tudo em aberto e nada está definido.

 

Parte II aqui

 

Fábio Mendes

Pedro Mendes

Ricardo Veiga

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4 pensamentos sobre “Entrevista a Manuel Pedro Fernandes (Parte I)

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